segunda-feira, janeiro 18, 2010

E deixam-nos ?




Notícias anteriores referiam a prática de desnatação pela gestão privada do Hospital de Braga... para quê gastar dinheiro em retrovirais para a gajada da SIDA e medicamentos biológicos para a brigada do reumático?

Mas neste corta e corta das despesas, eis que a Comunicação Social levanta mais pontas do véu.

Mesmo tendo em conta um possível efeito placebo, veja-se o que dizem os entendidos e a atitude tomada por alguns neurologistas


Hospital impõe medicamento mais barato
Grupo Mello Saúde, que gere o Hospital de Braga,mudou medicação a dezenas de doentes neurológicos,obrigando-os a assinar um "consentimento informado".

Mais de uma dezena de doentes acompanhados pelo Serviço de Neurologia do Hospital de S. Marcos, estão sem receber tratamento há mais de duas semanas. Em causa está a substituição do medicamento Octagam (imunoglobulina humana normal) por Flebogamma, um outro medicamento adquirido pelo Grupo J. Mello Saúde, actual responsável pela gestão do hospital, que os doentes afirmam ter efeitos secundários "insuportáveis".


"Tomei uma vez o novo medicamento e senti-me tão mal que acabei na urgência do hospital", disse, ao JN, Sílvia Rodrigues, doente com Miastenia Grave. Sílvia, tal como outros doentes, faziam o tratamento, em média, cinco dias por mês. "Já devia ter feito a medicação há duas semanas mas não sou capaz de receber o novo remédio, o hospital deu-nos garantias de que poderíamos voltar ao medicamento anterior mas não está a cumprir", afirmou.




Para a troca do medicamento, os doentes tiveram que assinar um "Consentimento Informado" onde autorizam o novo procedimento médico e as consequências ou complicações que possam daí advir. Cada documento, para além da assinatura do paciente, tem também a assinatura do médico que acompanha o tratamento.


No local destinado à descrição do procedimento médico, alguns neurologistas fizeram questão de escrever que a substituição do IGIV Octagam por Flebogamma foi "imposto pelo Conselho de Administração".

Maria Costa e Silva, mãe de Susana Pereira, uma doente de neurologia, corrobora as críticas: "O Hospital de S. Marcos está a obrigar os doentes a responsabilizarem-se pelas consequências de um medicamento que não conhecem e que nunca tomaram".
Conceição Pereira recusou assinar o consentimento para a mudança de tratamento. "Estou há quase dez anos a tomar um remédio com o qual me sinto bem e que quase me ressuscitou e agora. Só porque mudou a administração do hospital, tenho que mudar?".

Em comunicado enviado ao JN, a administração do J. Mello Saúde confirma a mudança de medicamento. "O hospital, agora inserido num grupo de saúde que faz periodicamente os seus concursos para a aquisição destes produtos, tem disponível o medicamento em causa (Flebogamma), a imunoglobulina humana, aprovada pelo INFARMED e considerada como bioequivalente à outra marca comercial em uso no país", refere o documento.

"Só conheço o Octagam"


Carlos Fontes Ribeiro, especialista em farmacologia, diz que não há estudos europeus sobre bioequivalência e que, em medicamentos biológicos, não se pode falar em medicamentos "equivalentes ou similares".
"Só conheço o Octagam e, quando prescrevo o medicamento, refiro-me sempre como sendo imunoglobulina humana", diz por sua vez José Pereira Monteiro, neurologista no Hospital de Santo António e presidente do Colégio de Especialidade de Neurologia da Ordem dos Médicos.

Sem a medicação que costumavam tomar, os pacientes tentam resistir à doença. "Muitos de nós já fizemos uma reclamação no Livro Amarelo e tentamos reunir com a administração do hospital", frisou Sílvia Rodrigues.

Com a administração do S. Marcos não foi possível reunir, mas um grupo de doentes conversou com o director de serviço de neurologia do Hospital de Braga. "O médico disse-nos que era preciso poupar nas despesas, comparou o hospital com a casa de cada doente e perguntou-nos se, na nossa casa, também não fazíamos poupanças", recordou Sílvia. "Assumida a qualidade do produto, o preço é um factor tido em conta para a escolha em concurso", finaliza o comunicado do Grupo Mello Saúde.

2 comentários:

R.A. disse...

Coloquemos as seguintes hipóteses, meramente especulativas:
1. O negócio ligado a estes medicamentos atinge milhões de euros no SNS.
2. O medicamento mais caro não é tão eficaz como os seus promotores fazem crer.
3. O medicamento mais barato é comparável.
4. Os promotores do medicamento mais caro conseguem convencer os médicos a convencer os seus doentes de que ele é o melhor.
5. Os doentes deixam-se convencer porque, afinal, vivemos numa época em que TODOS (jornais, blogues, pessoas ingénuas, líderes de opinião, anónimos) contribuem para descredibilizar TODAS as entidades em quem habitualmente se confia(va): OMS, INFARMED e outras agências, comissões de farmácia hospitalar, governos, políticos, médicos... [e por vezes isso acontece com alguma ajudinha dos próprios!] - é o que se pode chamar o "efeito placebo invertido", já que tal como acontece muita vezes, um medicamento atua melhor se o recetor espera que atue, também os efeitos secundários são mais nítidos se o doente está à espera deles.
Creio bem que se se admitirmos estas hipóteses, compreenderemos melhor o que o JN relata. Mas pode ser que eu esteja enganado.

Enfº do Norte disse...

É poupar no que se não devia...
uns recebem salários vergonhosamente milionários, outros, vivem na penúria.

É poupar nuns quantos enfermeiros para os serviços, por isso melhor pô-los a eles e aos médicos a alombar umas quantas horas extra, para compensar a falta de pessoal.

É poupar na qualidade das refeições, e dar um lanchito parco para quem faz turnos de noite;

é poupar em medicamentos supostamente "equivalentes" mas que a nível de efeitos esperados e secundários, é o que se vê.

Este despesismo envolto num embrulho bem decorado de "poupança", está a afundar a qualidade dos cuidados de saúde...