A figura do médico de família ainda não foi descoberta pelos intelectuais portugueses e particularmente pelos jornalistas. Sobre o internista hospitalar poucos saberão que é um especialista em medicina interna.
(Numa anterior greve de médicos de família uma jornalista afirmou que estes médicos só serviam para transcrever para o Serviço Nacional de Saúde os pedidos dos médicos privados!)
Para os intelectuais, se parece que dói o coração, vai-se directamente ao melhor cardiologista, de preferência a um que tenha a anteceder no nome a palavra professor; se parece que aquela tosse não passa ao fim de 8 dias, vai-se ao pneumologista, mas se se aguardasse mais 3 ou 4 dias, desapareceria como que por milagre.
É tão giro dizer: o meu pedopsiquiatra, porque dizer, o psiquiatra dos meus filhos, já pode fazer pensar que somos malucos. Nem que vá ao cardiologista uma vez de 10 em 10 anos, será sempre o meu cardiologista.
Há duas especialidades por quem tenho enorme respeito: os generalistas e os internistas.
Os primeiros são os médicos de família, que em Portugal existem há pouco mais de 20 anos, mas nos países desenvolvidos, pertencem a uma especialidade com dezenas e dezenas de anos em constante evolução. A American Academy of Family Physicians foi fundada em 1947! A Associação Portugesa dos Médicos de Clínica Geral foi fundada em 1981. Em Portugal os médicos de família herdaram uma pesado fardo, do qual ainda não se conseguiram (ou não deixaram!) libertar: as famosas Caixas de Previdência (ainda hoje se diz "vou à Caixa") e os burocráticos Serviços Médicos-Sociais.
Reunidos em Vilamoura no seu 21 Encontro Nacional ouviram o Sr Ministro fazer muitas promessas sobre a melhoria dos cuidados prestados nos Centros de Saúde. Travaram uma luta recente contra uma lei que o Ministério promulgou, mas que o próprio Ministério, ainda antes de a regular, já a ultrapassou criando uma nova figura: a fagocitose dos Centros de Saúde pelos Hospitais empresa. Terá o Médico de Família os seus dias contados? O seu futuro incerto? Uma conclusão é certa: não é com estas indefinições que se cativam médicos para trabalhar com motivação nos cuidados de saúde primários...
Os internistas ou especialistas em medicina interna, são (ou foram!) a alma e o corpo de muitos hospitais e por muitas décadas. Eram os médicos que primeiro encontrávamos nas urgências hospitalares.
Actualmente as tutelas dos hospitais SA estão a privilegiar os intensivistas para as emergências hospitalares e os médicos indiferenciados e enfermeiros para as triagens (de Manchester) e os atendimentos nas urgências.
Segundo a própria Sociedade Portuguesa de Medicina Interna os seus anos dourados foram na década de 50, tendo a sociedade sido fundada em Dezembro de 1951. Se a constante evolução da Medicina para a especialização e o permanente aparecimento de muitas sub-especialidades dentro das várias especialidades, originou um movimento contrário na área extra-hospitalar, com o aparecimento da filosofia generalista, agora mais diferenciada, na área hospitalar, a medicina interna ia perdendo elementos e importância e segundo a SPMI, "a 28 de Maio de 1983 efectuou-se uma Assembleia Geral da SPMI na qual estavam presentes apenas 4 sócios efectivos". Mais tarde "a SPMI entrava assim na sua 2ª fase, em que partia da estaca zero" e não "conseguiam evitar um movimento irreversível e já consumado: a separação das sub-especialidades médicas. Daí em diante a Medicina Interna teria que assumir a sua própria identidade e iria tentar sozinha recuperar o tempo perdido."
Proximamente realizará o seu 10º Congresso Nacional. Será que vai conseguir recuperar o tempo perdido?