segunda-feira, dezembro 27, 2004

Aviso

Novo endereço de correio electrónico: memai@sapo.pt.

domingo, dezembro 26, 2004

Perdas de Natal

O sr M. Velhinho faleceu no Natal.

"- Senhor doutor acha que o meu Velhinho está para morrer?
- Minha senhora, o senhor Velhinho está muito velhinho, mas nós não podemos, nem sabemos adivinhar o futuro. Uma hora, um dia, uma semana, um mês, um ano, tudo pode acontecer ao seu marido velhinho."


8 dias depois desta conversa o sr Velhinho faleceu.
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"Doutor, perdoe-me, sei que isto não é um consultório on-line, mas poderia dizer-me o que é leucemia galopante (ou leucemina fulminante)? é que tenho uma GRANDE amiga minha que morreu com 16 anos este verão... : "Ela tinha tudo pela frente... Fiquei revoltado... apenas gostava de saber o porquê desta patologia aparecer, visto que ela sempre foi saudável, tendo ido dia 3 de Julho ao hospital por uma dor de garganta e ter morrido no dia seguinte... Uns a chorar por Portugal ter perdido com a Grécia, ela (R.) a lutar pela sua (curta) vida..."
D F, 19 anos."


A GRANDE amiga faleceu por uma doença fulminante. Há várias doenças fulminantes. Em horas levam um vida perante a impotência da Ciência e dos médicos. As leucemias fulminantes são um caso paradigmático. Em muitas o primeiro e único sintoma é uma dor de garganta. Mas há mais, desde hepatites fulminantes a septicémias fulminantes.

Nem erro de diagóstico, nem negligência médica, nem problemas iatrogénicos. Mas algo cuja etiologia ainda não foi esclarecida totalmente...

O Natal É ...

... O Que O homem Quiser (Ou O Homem Permitir!)

sábado, dezembro 25, 2004

Silêncio Pós-Consoada

Explicações e Presunções

Consoada.

À volta de uma mesa, com o bacalhau e as batatas, e uns copos de tinto

economista explica economia a intelectuais

juíz explica justiça a intelectuais

advogado explica advocacia a intelectuais

professor explica pedagogia a intelectuais

artista explica arte a intelectuais

matemático explica matemática a intelectuais

e um Médico Explicou Medicina a Intelectuais.

Manteve-se anónimo apesar de nele falarem.

Ninguém foi presunçoso.

Explicar medicina a intelectuais será presunção?

Não será presunção outros intelectuais pensarem que dominam a Medicina?

Quanto à Visão, agradeço a distinção! E informo que sou absolutamente desconhecido nesse local.

P.S.: Só admito o adjectivo de prezunçozo ao Alvino.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

Na Minha Terra

Não há vaidades.
O pensamento é livre.
Não há limites para a imaginação.
Faz-me falta olhar para a minha terra.

Só é pena pela primeira vez não encontrar na minha terra quem gostava de encontrar, mas as leis da vida ninguém as decreta, ninguém as promulga. Existem e são inexoravelmente o nosso destino...

quinta-feira, dezembro 23, 2004

Também Vou À Terra

O médico explica também vai à terra.

Não sabe se na terra terá novas tecnologias.

De qualquer forma Boas Festas.

Se Santas ou não, dependerá da Fé de cada um.

terça-feira, dezembro 21, 2004

Não Há Triagem de Manchester Que Resista Ao Isolamento

Ou à honestidade!

Depois de ter passado todas as barreiras coloridas, ei-la frente a frente com o médico.

Pela triagem, era a "falta de ar" que a afligia.

Frente a frente:

- Então de que se queixa?
- Estou muito doente. Estou mesmo muito doente. Mas a verdade é que estou só. O isolamento é que me mata.

Não há tratamento urgente para isto.

Não há explicações a dar aos intelectuais sobre isto.
E quantos intelectuais também passam por isto?
Alguns. Pelos mails que vou recebendo!

Este episódio está a acontecer. Interrompi a consulta para "bloggar". E para pensar no Natal.

E entrou-me um cisco para os olhos, tenho que limpar esta humidade da Humanidade.

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Apontamento Sobre O Velhinho

- Senhor doutor gostava que fosse ver o meu pai a casa. É muito velhinho. Tem 91 anos.
- Mas de que é que ele se queixa?
- Deixou de andar. Deixou de falar. Está muito velhinho.
- Amanhã passo por lá. Pode ser?
- Sim.

No dia seguinte. Já em casa do paciente.

- Como se chama este velhinho simpático?
- M Velhinho.
- Sim. Velhinho eu sei que ele está. Mas qual o apelido dele?
- Velhinho. Chama-se M Velhinho.
- Velhinho?
- Sim senhor doutor o meu marido está muito velhinho e chama-se Velhinho.

No fim da consulta.

- Senhor doutor acha que o meu Velhinho está para morrer?
- Minha senhora, o senhor Velhinho está muito velhinho, mas nós não podemos, nem sabemos adivinhar o futuro. Uma hora, um dia, uma semana, um mês, um ano, tudo pode acontecer ao seu marido velhinho.

sábado, dezembro 18, 2004

Ai estes Jurnalistas E Os Micronavios

Mas como sempre a culpa é do médico . Transcrevo:

"Identificação electrónica é obrigatória há cinco meses.
Mais de 200 mil cães já têm "microship".

Segundo o Público de hoje, andam por aí mais de 200 mil cães com micronavios... Seja lá isso o que for!!! De facto é adequado para um país de marinheiros.
É este o jornalismo que temos..."


Se não acreditam, está aqui, no Poblico, de 22 de Nubembro.

sexta-feira, dezembro 17, 2004

Um Pedido

de um jurnalista do Poblico ao Médico Explica Medicina A Intelectuais e largado na caixa do correio.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Acreditem Que Gostava ...

... de escrever mais e relatar alguns episódios da minha vida.


Hoje trabalhei mais de 12 horas.
Trabalhar significa para nós, ouvir, intervir quando necessário, deixar ouvir, discorrer "placebamente", ouvir, ouvir, ouvir, intervir pouco, intervir muito, intervir intensivamente, intervir nos limites, ultrapassar os limites, ir buscar ao Além alguns, deixá-los partir também, sorrir às vezes. Ouvir sempre!

Passadas doze horas, às vezes é necessário descomprimir.
Desligar a televisão. Apagão.
Ficar só neste mundo que não nos compreende.
Desconfiar daqueles que só gostam da $aúde.


Há dias um colega confessou-me que gostava de me conhecer. Porquê? A maior parte dos médicos são anónimos como eu. Ninguém os conhece. Há generalistas e generali$$$tas. Há especialistas e especiali$$$tas. Desde o mais simples interno geral ao mais afamado chefe de serviço há uma plétora de homens e mulheres conscientes da sua profissão.

Fico com erisipela quando as televisões e outros media fazem passar apenas a nódoa e transformam-na em regra.

Há médicos amigos dos seus doentes, desde o médico de família que o conhece há 20 anos, ao intensivista que o observa apenas durante horas.


Hoje depois de 12 horas de trabalho assistencial diverso (é preciso ganhar a vida!) alguém me convidou para o primeiro aniversário da sua vida.

Gostei do presente do aniversariante: "para o meu querido médico!". Tocou-me fundo.
Mas sei que os médicos só são queridos quando as "coisas" correm bem. Que me perdoe o aniversariante, mas o médico tem sempre esta perspectiva.
Só espero que não leiam este post até repousar nas profundezas dos arquivos.

Mas, após doze horas no limiar da incerteza e do risco: É ou não é? Foi ou não foi? Será ou não será um enfarte? Evacuo ou não evacuo? Será só uma reação aguda ao stresse ou uma crise de hipertiroidismo?
Depois de doze horas deixei-me levar pelo sabor do champanhe.
Foi o que me ofereceram.
Foi o que bebi.
Foi o que excedi.
Fez-me bem.
O álcool pode ser um bom psicofármaco, quando prescrito ou auto-medicado com consciência.

Mas não abusem, por favor!

segunda-feira, dezembro 13, 2004

[também posso ir?]

Carta resposta publicada no pasquim Expresso (ex-referência do jornalsmo português) de 11-12-2004:

"Li no artigo «Farmácias com descontos chorudos» (EXPRESSO, 4-12-04), uma «sugestão de notícia» acerca da conduta dos médicos: ainda no passado fim-de-semana, cerca de 150 psiquiatras estiveram no Algarve, a convite de um laboratório, mas sem programa científico.

Além de considerar que uma jornalista não deve produzir trabalho profissional genérico, sem rigor de concretização, a não ser que se trate de artigo de opinião, o que este não pretende ser, e que tenho o EXPRESSO por semanário onde a especulação sob capa de notícia não tem lugar, apelo à publicação de desmentido a que acrescento prova. Como palestrante no Simpósio Científico, que se realizou a 27 de Novembro no Algarve - Stª Eulália (se é a este que se querem referir), envio o programa científico e também a comunicação científica que apresentei.

Reitero o meu mais profundo protesto quanto a mais uma vileza relativa ao bom nome dos médicos portugueses. Convido as senhoras jornalistas, autoras da notícia, para um encontro [também posso ir?] onde talvez possamos compreender as razões de tais repetidos comportamentos persecutórios face ao bom nome dos médicos e lhes ajude a discernir as sérias repercussões que este tipo de atitude tem na saúde das populações.

Manuel Costa Guerreiro, Cruz Quebrada
"

Notícia Esquisita e Mais Uma Vez Manipuladora ... Falam, Falam, Falam E Não Dizem Nada"

Notícia muito esquisita do Comércio do Porto de 11/12/04 do jornalista João Santos.
Por um lado e mais uma vez, o título não condiz com o conteúdo. Manipulação! Desrespeito pelos leitores.

O título postula peremptório:
"Segredo profissional na saúde é ainda mal percebido"

O que é um profissional da saúde para o Povo? Médico, médico, médico, médico e só depois os outros profissionais, nomeadamente os enfermeiros.

O que diz a notícia?

"Esta é uma das principais revelações patentes no livro do enfermeiro .../..., ontem apresentado numa sessão que decorreu no edifício do Sindicato dos Enfermeiros. A publicação do livro surgiu no âmbito da tese de mestrado em desenvolvimento e subordinada ao tema "Teologia e Ética da Saúde". José Azevedo incluiu na sua investigação um inquérito realizado a um universo de mais de trezentos enfermeiros tendo sido verificado, entre um grupo significativo de elementos, um entendimento "mal percebido" e um "enorme subjectivismo" em questões que rodeiam a aplicação e a defesa do segredo profissional. José Azevedo, presidente do Sindicato dos Enfermeiros, actual enfermeiro-chefe do Hospital São João, têm desenvolvido um importante conteúdo teórico sobre a enfermagem e as suas ligações ao campo ético e social na sociedade. Paralelamente conta um trabalho reconhecido pelos seus pares enquanto dirigente no sindicato a que aderiu há mais de trinta anos."
  1. A notícia fala de um inquérito a cerca de 300 enfermeiros. O título fala dos profissionais da saúde, isto é, os médicos não sabem o que é o sigilo profissional.....
  2. Quem conhecer o sr enfermeiro Azevedo, sabe muito bem que a notícia não pode corresponder à verdade.
  3. Mestrados: quem quer comprar?. Vendo a crédito e a prestações...

sexta-feira, dezembro 10, 2004

European Heart House

Je suis la.

Confesso que aceitei o convite de uma multinacional do medicamento para visitar e frequentar um curso integrado num Programa Educacional da Sociedade Europeia de Cardiologia.

Aceitei. Pronto. Pelos que tenho recusado por nao oferecerem credibilidade.

E nao houve contrapartidas, descansem.

Talvez nunca conhecesse a European Heart House.

A industria farmaceutica tambem pode ter um papel positivo na preparacao cientifica dos medicos, com cuidado e com limites.

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Ri-te, Ri-te

O Boticário poveiro, decidiu (mais uma vez) meter-se comigo. Está no seu direito, até já estava com saudades. Diz ele que se riu "... com vontade da gaffe assumida do médico explica medicina a intelectuais que não estudou toxicologia nem compostos organoclorados e portanto diz, como os jornalistas que ele adora corrigir, "Dealdrina". Sabe sempre bem ver um presunçoso a espalhar-se no tapete. Então, sua sapiência, não conhecia o 1,2,3,4,10,10-Hexacloro-6,7-epoxi-1,4,4a,5,6,7,8,8a-octa-hidro-1,4-,endo,exo-51,2,3,4,10,10-hexa-8-dimetanonaftaleno?"

Diz que sou presunçoso. Só não sei como é que um presunçoso admite ter errado.

Mas como o gosto de ver irritado, atiro-lhe com as negociatas do seu chefe: João Cordeiro.

"Farmácias com descontos chorudos
Há laboratórios que oferecem às farmácias mais 30 embalagens de um genérico pelo preço de dez. No final, o Estado é que paga
OS LABORATÓRIOS que vendem genéricos estão a fazer ofertas chorudas às farmácias para que estas prefiram os seus medicamentos aos da concorrência. Em vez dos médicos, o alvo destes laboratórios são agora os farmacêuticos, estando já generalizada a oferta de variadíssimas bonificações - as quais vão desde os créditos em viagens às ofertas, que chegam a 300% sobre a compra de embalagens do medicamento (pela compra de 10 caixas, recebem-se de borla mais 30).
Os responsáveis do sector - do Ministério da Saúde à própria Associação Nacional das Farmácias (ANF) - afirmam-se «preocupados» com a situação que, segundo o próprio presidente da ANF, João Cordeiro, torna «completamente irracional o mercado». Vive-se mesmo, disse Cordeiro ao EXPRESSO, «o salve-se quem puder».
"
.../...
"Há cerca de um ano, Luís Filipe Pereira recebeu uma denúncia onde eram relatados vários exemplos desta prática. Nessa denúncia, que chegou a ser noticiada, eram feitas referências a dois laboratórios nacionais de genéricos e a exemplos concretos de bonificações, lançando a suspeita sobre as margens de lucro que as farmácias estavam a obter à custa dos genéricos."
Para que não diga que faço censura, (notícia que não aproveite para censurar os médicos, não é notícia), aqui vai o resto da notícia da Graça Rosendo, no Expresso de 04/12/2004:

"Ainda no passado fim-de-semana, cerca de 150 psiquiatras estiveram no Algarve, a convite de um laboratório, mas sem programa científico. Também esta semana, outro laboratório levou para Roma 15 psiquiatras, com acompanhantes, numa acção de promoção de um outro medicamento. Em Novembro, artistas como Herman José, Luís Represas e Rui Veloso foram contratados para animar reuniões ditas científicas que juntaram, em diferentes jantares, mais de dois mil clínicos. Os anfitriões foram diferentes laboratórios e o objectivo dos encontros foi sempre o mesmo: promoção de medicamentos."

E ninguém me convidou. Será que não me conhecem? Pois eu conheço tantas delegadas de informação médica tão simpáticas. Será que não sou simpático? Também quero ir.
Também quero ir como foram muitos farmacêuticos a Marrocos convidados pela Farmoz, um laboratório de genéricos. Mas para a Gracinha Rosendo, só os médicos é que viajam... E depois admirem-se porque é que o sr João Cordeiro quer que os farmacêuticos tenham liberdade de troca de genéricos. A Farmoz levá-los-ia a uma volta ao mundo...
"O CONSUMO de apenas três medicamentos aumentou em €32,2 milhões a despesa dos portugueses com fármacos, nos primeiros nove meses do ano. São quase 12% dos €277 milhões de crescimento apurado neste período, revela um estudo da Associação Nacional de Farmácias (ANF) a que o EXPRESSO teve acesso. O mesmo estudo revela que a dispensa destes três medicamentos - Clopidogrel, Rosuvastatina e Escitalopram - era inexistente ou residual no período homólogo de 2003. E qualquer deles é o mais caro dentro da sua família e não tem genérico." - aqui estou de acordo com a ANF. Só que uma das críticas para a introdução de genéricos era a de que as novas moléculas teriam preços exorbitantes e pelos visto parece confirmar-se.

"O consumo de Clopidogrel aumentou de forma considerável, enquanto decresceu a procura da Ticlopidina e do Dipiridamol, que, segundo o estudo da ANF, actuam de igual modo na prevenção do acidente cardiovascular. Entre Janeiro e Setembro foram vendidas 360 mil embalagens de Clopidogrel que custaram mais de €20 milhões. A própria «aspirina de 100 miligramas faz o mesmo efeito», diz o presidente da ANF, o farmacêutico João Cordeiro." Mas diz mal, porque essas moléculas não actuam da mesma forma, nem têm as mesmas indicações.
Eu apoiaria uma inspeção a todos os médicos que presceveram clopidogrel para prevenção primária, pois este óptimo medicamento só deverá ser utilizado em determinadas situações muito específicas.

sexta-feira, dezembro 03, 2004

Muitos Intelectuais Só Conhecem O Médico ...

... dos consultórios da grande privada, os professores doutores, ou das grandes clínicas onde recorrem em situações de crise e vulneráveis.

Por isso, quando a vulnerabilidade desaparece, aparece a revolta contra o poder médico, a revolta contra os €€€€€€ que lá desapareceram e generalizam esses médicos (os barões da medicina) a toda a classe médica.

Mas o médico também é isto:

A minha 1ª vez

"Não. Não é sobre o que estão a pensar. Esta história é acerca do meu primeiro contacto directo com "doentes", ou melhor dizendo, com utentes do SNS.
Corria a Primavera do meu 1º ano na Faculdade. As nossas grandes preocupações, eram a conveniente preparação da 1ª QUEIMA, esse momento memorável de todos os estudantes do Porto, em que pela primeira vez deixam de ser caloiros e passam a ser aceites como "iguais entre iguais".

Apenas alguns dias antes desse tão importante momento, tive a missão de realizar um "inquérito de satisfação" aos utentes de um CS na região do Grande Porto. De relação médico-doente, propriamente dita, não tinha nada. Contudo, o peso da bata-branca, desde cedo aprendi ser importante para estabelecer esta relação. E foi numa dessas belas manhãs de Abril (ainda frias e chuvosas), que depois de ter acordado às 6h00, para poder chegar ao CS antes da abertura (às 08), que senti ter a minha primeira experiência, o meu primeiro contacto real com doentes. Até aí, mais não sabia do que espreitar por um microscópio e "conversar" com as peças inertes do Teatro Anatómico.

Ela era simpática. Dizia que tinha 96 anos, mas não lhe daria mais de 90 :). Pequenina e magrinha. Filha de pescador, viúva de pescador e mãe de pescador. Tinha nascido no início do século. Tinha conhecido reis, presidentes e ditadores. Lembrava-se de tudo claramente. Tinha uma saúde de ferro - HTA, ICC classe II NYHA e DM tipo 2 (longe de mim imaginar o que significava tudo isto... só o compreendi uns tempos mais tarde).
As cerca de 20 perguntas de que era composto o questionário (não demoravam mais do que 5 minutos) deram conversa para quase uma hora. Vieram à baila histórias da juventude, o namorado que a abandonou e foi para o Brasil, o casamento, os filhos, o casamento dos filhos, os netos, o casamento dos netos, os bisnetos, as fotografias dos bisnetos. As queixas dos médicos (os outros, porque o dela era muito bom - graças a Deus). As esperas no CS, o preço dos medicamentos, a reforma que era baixa.
Palavra-puxa-palavra eu que era um doutor-muito-jovem (como ela fazia questão de me chamar - olha o efeito da bata branca) fui-me deixando enlear pela conversa, pela necessidade de carinho e atenção. Ainda hoje, quando não tenho tempo para ouvir e utilizo a "técnica de entrevista" tantas vezes ensinada e aprendida uns anos mais à frente, me lembro daqueles olhos carentes, de quem precisa de ser ouvido.

Entretanto é chamada para a consulta. Levanta-se com genica impressionante para os 96 anos bem-vividos e beija-me na face. Vai-se embora dizendo: "Sr. Doutor, quando vier trabalhar para aqui quero ser sua doente. Vou pedir para trocar de médico"
Também eu gostaria de a rever. Não conhecia ainda o significado de "empatia" esse palavrão atrás do qual os médicos se escondem para defender a sua sanidade mental."

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Vital Moreira: Corporativista

Em 16 de Novembro de 2004, publicou Vital Moreira (VM) no Público, um artigo intitulado: "A Disciplina das Profissões".

Diz VM que "Justifica-se plenamente o destaque dado aqui no PÚBLICO de domingo passado à publicação das decisões disciplinares pela Ordem dos Advogados. Primeiro, porque se trata de um gesto inédito, pois é quase desconhecida a prática disciplinar das nossas ordens profissionais. Segundo, porque se verifica que a função disciplinar de uma profissão tão importante como a dos advogados está a ser efectivamente exercida, incluindo várias decisões de expulsão da profissão nos casos mais graves. Terceiro, porque, face aos acrescidos riscos para a deontologia profissional na sociedade actual, uma iniciativa desta natureza é uma importante arma contra a desconfiança e o descrédito das profissões."

VM tem publicado muitos artigos em que acusa toda uma classe profissional, os médicos, de corporativista, de que os erros médicos e mesmo a negligência são escondidos inter-pares e que a Ordem dos Médicos é relapsa na condenação de casos disciplinares. Isto tem dito VM ao logo dos anos.

Quando o lia, estava convencido de que VM era um estudioso da problemática das Ordens profissionais e nomeadamente da Ordem dos Médicos. Mas não. Pelos vistos VM sempre escreveu de cor. Levado pelo "ódio" que muitos intelectuais têm contra os médicos, particularmente os juristas, escrevinhava sem ter lido pelo menos um único número da Revista Ordem dos Médicos.

Neste artigo em referência, VM desde a primeira linha até ao último ponto final, enaltece e idolatra a sua Ordem e a sua decisão de publicar na sua revista os processos disciplinares que ele mesmo instaura. Diz, e com toda a razão, que os advogados devem ser julgados pelos seus pares. Digo eu, que os médicos devem ser julgados também inter-pares, assim como os engenheiros, etc.

Agora.
Porque em tempo sempre criticou a Ordem dos Médicos por querer ser ela a analisar os contextos e os erros ou negligências médicas, em parceria com outras estruturas.

E mente.
Talvez por negligência, quando afirma que é inédito a publicação dos processos, das decisões e dos resultados referentes a queixas instauradas contra médicos e dirigidas à Ordem dos Médicos.

Há dezenas de anos que o Boletim da Ordem dos Médicos publica as sanções, incluindo as penas de expulsão contra médicos...