“Uma freira aldrabona”
Com a devida vénia transcrevo um post do blogue A INQUIETUDE PERMANENTE.
São textos onde o rigor científico está omnipresente.
A Internet tem sido bombardeada com milhares de afirmações das mais variadas origens, umas mais científicas que outras, sobre uma teoria da conspiração em relação com a vacina contra o vírus pandémico Influenza A (H1N1)2009.
Tão bombardeada que, mesmo os mais alertados contra o lixo que circula na Internet, ficam com dúvidas sobre o que se lê!
E duvida-se porquê?
Em meu entender as instituições estão descredibilizadas. Os interesses das grandes companhias multinacionais conseguiram penetrar nas instituições. Os escândalos vão aparecendo…
A crise financeira deitou por terra a pouca credibilidade que ainda restava em instituições sólidas como era a banca e os seguros.
Mas, voltemos à freira:
“A gripe (XXXVIII)
Uma freira aldrabona
Tenho muito que fazer e vou deixando para trás coisas até importantes, como, nesta situação de gripe, desmontar a incrível campanha de desinformação que por aí anda. Uma das peças a que se tem dado mais credibilidade é a entrevista com a freira Teresa Forcades (TF), depois da fácil denúncia de fraude de um tal "Dr" Horowitz, da óbvia paranóia da jornalista Jane Bürgermeister que invoca uma pretensa qualidade de jornalista da Nature, do caso triste de sequelas mentais de um acidente sofrido por uma "ministra da saúde" finlandesa que nunca o foi e que sabe de gripe o que lhe dizem os seus contactos extra-terrestres.
A freira é mais perigosa. Invocando um doutoramento em saúde pública, falando calmamente num cenário religioso, descrevendo casos aparentemente convincentes, elaborando um longo discurso articulado, pode parecer credível. Começo pela duração do vídeo. Duvido de que a grande maioria dos que andam a divulgá-lo tenham visto quase uma hora de filme. Por isto, também eu só agora escrevo sobre isto. No entanto, isto não impede que dezenas de milhar de pessoas o andem a difundir, com um “sound bite” este sim eficaz: "agora não é qualquer aldrabão, é uma freira doutorada em saúde pública. Vejam!" Claro que ninguém vai ver, mas passa-se a mensagem.
Comecemos por esse doutoramento. Pesquisei ao máximo e não o encontro. TF é médica e foi interna de medicina geral em Nova Iorque. A partir daí, a sua intervenção é quase exclusivamente religiosa, embora se encontrem dela declarações médico-religiosas, principalmente sobre o aborto, com o cariz que se imagina.
Uma doutorada tem obrigatoriamente publicações científicas. Fui pesquisar, coisa muito simples (Medline). Tem uma, numa revista obscura, sobre… homeopatia! Numa lista de teses de medicina, vejo que a sua é sobre o impacto das medicinas alternativas nos estudantes de medicina. Doutorada em saúde pública?!
Mas admito que os simples factos curriculares, justificativos de descredibilização pessoal, não são suficientes para levar à certeza de que as posições e afirmações são falsas. Ao fim de penosa visão do vídeo, recolhi tão extensa lista de coisas já ditas e reditas no quadro da teoria da conspiração sobre a gripe que já cansa: a célebre vacina contaminada com a gripe aviária H5N1, coisa de que não há a mínima prova (Goebbels sabia bem que uma mentira dita muitas vezes é uma verdade); os crimes das grandes companhias farmacêuticas com Rumsfeld a pontificar; a insinuação clara de que falhou o plano tenebroso (trilateral?) de criar um vírus que mataria dois terços da humanidade e agora há que fazer o mesmo com uma vacina; o risco do sindroma de Guillain-Barré, sobre o qual já aqui escrevi; e não podia faltar o que até muitos médicos portugueses estão a agitar, o perigo do adjuvante baseado no esqualeno. Os adjuvantes são usados desde há muito tempo em vacinas sem que alguém conheça efeitos secundários demonstrados, para além de pequenas reacções inflamatórias locais, e todos os estudos feitos até agora sobre o esqualeno parecem demonstrar a sua inocuidade.
Do que mais gostei foi do rabo de fora do gato escondido. A certa altura, diz a “doutora” que tudo isto é uma fraude, porque “uma pandemia tem de ter uma grande mortalidade e esta não tem”. Nenhum meu aluno de virologia diz tal asneira sem chumbar, muito menos uma doutorada em saúde pública. Pandemia só tem a ver com disseminação da doença por todo o globo, não tem nada a ver com gravidade clínica ou mortalidade. Vão por mim, leitores de outras profissões. Isto não é betão, porque só vejo cimento à superfície e não vejo ferro. Inventei um motor que não precisa de fornecimento de energia. A Ursa maior é plana, com estrelas todas à mesma distância da Terra. Está provado que a papisa Joana existiu e não há dúvidas de que Colombo era primo de D. João II, filho do infante D. Fernando e de uma filha de Zarco. Foi Marlowe que escreveu toda a obra de um imaginário Shakespeare. Não estão habituados a tudo isto? Peço que acreditem que a tal afirmação da freira tem equivalente rigor científico.
Também fiquei curioso acerca da criação deste vídeo, por qualquer pessoa ou organização chamada Alish. Vendo melhor, é, mais uma vez, já cansa, uma “jornalista independente” espanhola, que publica num “site” chamado “Time for truth”. Vejam, se não tiverem nada mais importante para fazer. Há o que já se espera: textos sobre hipatias (alguém ainda vai nesta?) e, obviamente, a sua certeza em relação aos extra-terrestres. Lá me lembrei outra vez da “ministra” finlandesa e do seu conhecimento revelado por outros galácticos. Não há nada de novo sob o sol!
Acho que já chega de cera gasta com tão ruim defunto.
P. S. - À margem. Porquê o sucesso de tantas teorias da conspiração? Não é só a gripe. Na medicina, e em coisa com que lidei bastante, há alguns anos, também as fantasias mirabolantes sobre a doença das vacas loucas. As campanhas contra a vacinação também não são só quanto à gripe, há todo um movimento, principalmente americano, contra qualquer vacina, como as Testemunhas de Jeová a recusarem as transfusões de sangue. E o assassínio de JFK, a fraude da ida à Lua dos americanos, a destruição das torres de Nova Iorque programada pela CIA ou não sei bem quem, a falsificação da nacionalidade americana de Obama, etc. O que é que se passa nas nossas sociedades, na nossa cultura, na nossa comunicação social (em sentido amplo, incluindo a net e a blogosfera) que permite tão facilmente este tipo de coisas, mitos assumidos tão convictamente como a religião de seitas? Merece reflexão.
9 comentários:
Olhe que as declarações do bastonário da Ordem dos médicos não andam muito atrás.
Caro Farmacêutico, cada um tem o bastonário que merece. Nós temos um que apesar de oftalmologista, é cego, os enfermeiros têm uma que tem medo de dizer a verdade e perder o apoio e vocês, têm agora um que é a correia de transmissão da ANF. A vossa ordem perdeu a independência. Por isso digo no post, "as instituições estão descredibilizadas"...
TUDO DITO EM POUCAS PALAVRAS....
Só há uma prova: a prova de que não há prova do que quer que seja...só daqui uns meses se saberá se a vacina é completamente segura!
Acho piada a quem garante a segurança da vacina e diz que não há provas que ela seja insegura...não deveria ser ao contrário???? Não deveriam ser os laboratórios a garantir a sua segurança ...Estes gajos têm cá uma piada!!
Eu não crítico ninguém que não se queira vacinar ...enfermeiros, médicos ou outros!
FILIPE
Os comentários do bastonário da OM têm sido completamente irresponsáveis ...
Claro que ninguém deve ser obrigado a vacinar-se mas...não existem riscos para a saúde pública se os médicos não se vacinarem?
E aquele ar de achar que os médicos não se vacinam poe conhecimento a mais e os enfermeiros por desconhecimento fica mesmo muito mal ... não so enfermeio
Infelizmente tem razão. Qd se dá o braço a torcer, sou obrigado a dar também o meu.
A freira faz afirmações que não são rebatidas aqui. Por exemplo:
1) é verdade que a definição de pandemia foi alterada somente este ano (foi retirada a referencia à mortalidade de modo a "ajustar-se" a este virus da gripe A)
2)O facto de se ser incolado duas vezes ao contrario das outras vacinas da gripe normal
3)O facto de a composição desta vacina ter um componente 10 vezes superior ao normal (componente que induz uma resposta do sistema imunitario)
São estas questões que merecem ser rebatidas e não o suposto curriculo da senhora....
Você é que me saiu uma bela freira!!!
Se percebi bem ... os profissionais não se querem vacinar, mas ... se for médico é por excesso de conhecimento, se for enfermeiro ( supostamente quem administra a vacina e devia perceber alguma coisa!?) é por falta ... já agora se for padeiro é por ser muitíssimo sabedor ...
É UMA VERDADEIRA ANEDOTA ESTAS ORDENS SUPOSTAMENTE PROFISSIONAIS!!
E fica muito mal o exemplo que dão: as afirmações de alguns enfermeiros da saúde 24 (deviam ser mais RESPONSÁVEIS) e o SR. da OM devia ser MAIS EDUCADO e HUMILDE!!
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