Alguém me enviou uma troca de mails entre as nossas autoridades de saúde, que obviamente aqui são omitidas.
Mas fica esclarecida a má interpretação que a comunicação social lançou de forma indescriminada e que levou muitos médicos e população em geral a descredibilizar a vacina.
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From: @dgs.pt
To: coordenadorda
Sent: Friday, November xx, 2009 2:15 PM
Subject: FW: Guillain-Barré
De: xxxxxxxxxx[mailto:xxxxxxxxxx@insa.min-saude.pt]
Enviada: sexta-feira, x de Novembro de 2009 10:40
Para: xxxxxxxxxxxxxxxxxxx; xxxxxxxxxxxxxxxxxx
Cc: xxxxxxxxxxxxxx
Assunto: RE: Guillain-Barré
Prof. xxxxxxxxxxx
Prof. xxxxxxxxxxxxxxx
Viva, bons dias.
Por coincidência dei uma “entrevista escrita” a semana passada onde uma das perguntas foi precisamente a relação do Guillain-Barré com a vacina anti-gripe. Em 1977 estava na Neurologia dos Cxxxxxxxx, tive uma doente com Guillain-Barré e apresentei o tema numa das sessões do serviço - tinha acabado de acontecer o surto de Guillain-Barré nos USA (foi em 1976) e foi muito discutido. Agora, desde o início da pandemia, tenho vindo a actualizar-me, pois era previsível que o tema viesse à baila.
Aqui transcrevo o estrato da entrevista em que falo (escrevo) sobre o tema – está em linguagem para o grande público, com alguma formação académica, mas não médicos, dada a audiência prevista:
“ …
Guillain-Barré é o mais frequente síndrome conhecido de neuropatia inflamatória de base imune. Acontece quando o sistema imune responde a um estímulo antigénico com reactividade cruzada contra uma proteína da bainha dos nervos. Este estímulo antigénico na maioria dos casos é uma infecção banal, respiratória (mais frequente), digestiva (também não raro) ou outra. Na maioria das vezes não se consegue identificar o agente que deflagrou a reacção cruzada. Quando se consegue, o agente infeccioso mais frequentemente associado é uma bactéria digestiva causa frequente de diarreias banais, chamada Campylobacter jejuni.
No caso de 1976, pensa-se que foi uma reacção cruzada contra a vacina da gripe suína H1N1. Esta gripe surgira em Janeiro num gigantesco campo de treino militar em Fort Dix, USA, e adoecera milhares de recrutas, incluindo uma morte – quando se isolou o vírus e se constatou ser H1N1 (na altura o único vírus influenza A em circulação era o H3N2), ou seja do mesmo subtipo da temida gripe espanhola (pneumónica em Portugal), houve enorme alarme, e esta vacina não foi sujeita aos ensaios de segurança habituais devido ao sentimento de urgência e perigo eminente.
O Guillain-Barré é um quadro relativamente frequente, com uma incidência de ± 0,6 a 1,9 por 105 habitantes por ano, ou seja, em Portugal todos os anos se diagnostica entre 60 a 200 casos. O síndrome de Guillain-Barré é um quadro aparatoso, alarmante, e ainda que a mortalidade ande apenas pelos 2%, pode incapacitar por vários meses.
No caso da vacina gripal de 1976, a taxa de incidência foi de cerca de 1 caso por 105 vacinados, no mês seguinte à vacinação, ou seja, cerca de dez vezes mais alta que a incidência “background”. A vacina anti-gripe de 1976 foi a primeira vez que uma vacina esteve associada a este síndrome, e levou à suspensão desta vacinação. Estudos em modelos animais sugeriram que a reacção não foi contra o antigénio viral, mas sim contra um adjuvante, e por isso este adjuvante específico foi banido em todo o Mundo. Todos os anos se vacina milhares de milhões de pessoas com variadíssimas vacinas, e até hoje nunca mais se detectou qualquer outra vacina (incluindo todas as vacinas anti-gripais) associada ao síndrome de Guillain-Barré (isto desde 76, ou seja há 33 anos…).
…”
Assim, faço minha a advertência do Prof. Francisco George, que as probabilidades estatísticas indicam que seguramente vão aparecer alguns casos de Guillain-Barré temporalmente associados à vacinação, não por causa-efeito, mas apenas por coincidência.
Com os meus cumprimentos
xxxxxxxxx
xxxxxxxxxxx
Prof. Doutor
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Instituto Nacional de Saúde Drº Ricardo Jorge
Avª Padre Cruz, 1649-016 Lisboa
PORTUGAL
Tel: +351 21 751 9236 / +351 21 751 9200 ext. 1236
Fax: +351 21 752 6400
xxxxxxxxx@insa.min-saude.pt
-----Mensagem original-----
De: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx(mail.telepac.pt)
Enviada: quinta-feira, 5 de Novembro de 2009 21:48
Para: xxxxxxxxxxxxx
Cc: xxxxxxxxx; xxxxxxxxxxxx
Assunto: RE: Guillain-Barré
Meu caro F, é-me impossível estar tão a par da literatura toda da gripe como tu e cols. da DGS estão. Por isso, agradeço me informes quando possível de quais os critérios que devem ser seguidos durante a pandemia para atribuir causa de morte à infecção pelo vírus H1N1. Há critérios “oficiais” internacionais ? Alguém sabe ? Abraço xxx
De: F[mailto:xxxxxxxx@dgs.pt]
Enviada: quinta-feira, x de Novembro de 2009 17:32
Para: coordenadordagripe
Assunto: FW: Guillain-Barré
Junto ficheiro que clarifica a série histórica da síndrome de Guillain- Barré em Portugal. Como se demonstra, poderemos ter semanas (em termos de probabilidade) com 4 casos novos de síndrome de Guillain-Barré independentemente, sublinho, independentemente, da campanha de vacinação.
Por isso, temos que admitir, naturalmente, a ocorrência de fenómenos de coincidência temporal associada à vacina.
Obrigado
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