domingo, abril 12, 2009

Não Escondo Nada! A Culpa Não Pode Morrer Solteira!

Um anónimo desafiou-me. Aceito o desafio. E critico os termos provocatórios.


 

"Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "Intervalo":


http://www.correiomanha.pt/noticia.aspx?contentid=02221311-FC0A-4120-B6BE-75D7441FA5B5&channelid=F48BA50A-0ED3-4315-AEFA-86EE9B1BEDFF

MEMAI, que vai dizer desta?
Que também é deturpação jornalística?

Explique-me como é que se pode diagnosticar ansiedade a alguém que chega ao hospital com queixas de dor pré-cordial com irradiação, dispneia, arritmia e SÍNCOPE (!!!). Parece-me que o mais gravoso e absolutamente negligenciado aqui é a síncope!

Será culpa de quem? Do Espírito Santo? Do médico que, por ser estrangeiro, é incompetente?


A "culpa", que é que alguém a tem, ainda vai morrer solteira
."


 

Pela notícia, concluo:

  1. Tratava-se de uma doente de alto risco e como tal, todas as queixas têm que ser valoradas. P
  2. Pelo que ainda me apercebi, a doente fez tudo o que deveria ter feito: iniciou a entrada pelo seu Centro de Saúde, onde o médico de família a encaminhou para os cuidados secundários.
  3. Aqui é sujeita a uma segunda triagem e dão-lhe a cor amarela.
  4. Aqui temos o primeiro problema já muito discutido: o doente passa de uma triagem feita por um médico com observação, para uma triagem algoritma e impessoal, feita por um enfermeiro, que seguindo as queixas da doente (que até se pode exprimir de forma diferente, umas horas depois da primeira observação médica) a insere num algoritmo que pode nada ter a ver com os antecedentes da doente, nem com a apreciação feita por um técnico especializado médico, umas horas antes.
  5. ESTE É UM GRANDE VIÉS DA TRIAGEM DE MANCHESTER.
  6. Foi três vezes à mesma urgência. Com a informatização actual, esta terceira visita obrigatoriamente deveria ser muito valorizada, com a persistência dos sintomas.
  7. Parece que NUNCA houve a suspeita de patologia cardíaca e portanto não foram executados exames complementares de diagnóstico.
  8. Um dos grandes problemas das dores torácicas é saber a sua origem. Um médico calejado e com experiência, com os antecedentes pessoais desta doente que são factores de risco cardiovasculares, tentaria excluir uma patologia aguda cardiovascular (isquémica, trombótica ou aneurismática).


 

  1. EM CONCLUSÃO: só o resultado da autópsia e um inquérito nos poderá afirmar se há erro ou negligência ou a conduta foi correcta. Imaginemos que a doente faleceu de um aneurisma cerebral? Ou de um AVC fulminante? Ou de uma hepatite tóxica fulminante? Ou de uma reacção alérgica com choque anafiláctico?
  2. Em termos estatísticos, posso afirmar que há mais de 90% de probabilidades de ter falecido de causa cardíaca e que os seus sintomas não foram valorizados como deveriam.

11 comentários:

rmp disse...

MEMAI, subscrevo totalmente o seu post, principalmente no que diz respeito aos problemas graves que a triagem de Manchester por vezes cria.

Passa-se por cima de um raciocínio clínico sustentado em nome de uma algoritmo cego.

Ike disse...

Concordo com o post na totalidade.

Permita-me só que acrescente, em relação à conclusão, que se fosse necessário os 95% de probabilidades de causa de morte para a determinar, haveria muitas certidões de óbito que não seriam passadas aqui em Portugal...

E que nem sempre está disponível para atendimento um médico "calejado e com experiência"... (e mais não digo...)

Catsone disse...

Para além da tua exposição, corretíssima, temos que ter em conta outros pontos.
Não se sabem outros aspectos do evento. Sabe-se que a senhora tinha HTA, mas parece-me que se tratava de uma senhora relativamente jovem (48 anos) e não se pensa apenas em causas cv para óbito, embora venha sempre à cabeça e é de descartar à priori.
Um ataque de pânico por exemplo pode dar todos aqueles sintomas, incluindo SÍNCOPE. E não sei se a senhora estava a ser medicada com psicofármacos.
Um situação de espasmo esofágico pode causar dor pré-cordial que pode simular EAM.
Acho difícil um doente chegar no serviço de urgências com queixas de arritmia, no entanto, com o quadro, provavelmente se fez ECG, o resultado é que não sabemos, mas custa a crer que, se fosse anormal, a doente teria tido alta.
Não se esqueçam que a comunicação social dá a informação ao seu gosto, temos é que ler nas entrelinhas...
Não se podem tirar conclusões antes dos resultados da autópsia, mas se ficar provado que houve negligência, meus caros amigos, aí temos que averiguar culpas.
Bom dia.

Anónimo disse...

O NEMAI não tem razão nenhuma.

A senhora não morreu. Foi o jornalista que inventou a notícia para ganhar mais uns patacos.

Psiquiatra da Net disse...

Catsone:

Correctissimo. A crise de ansiedade pode dar sincope.

Em relação aos psicofármacos, importa esclarecer que a suspensão abrupta de certos antidepressivos pode desencadear uma crise de ansiedade, que pode ser aparatosa.

Contudo, importa reforçar que o diagnóstico de patologia cardíaca/outra patologia médica deve ser cuidadosamente descartado, e este diagnóstico deve ser quase encarado como "de exclusão", tendo em conta os factores precipitantes.

Não é, ainda, por alguem fazer psicofármacos ou ser seguido em Psiquiatria que se livra de ter outro tipo de patologia.

E às vezes as pessoas (leia-se, profissionais de saúde triadores) esquecem-se disso, sobretudo quando a triagem não tem guidelines definidas...

Este tipo de triagem, com todos os defeitos que tem (incluíndo a rigidez extrema) pelo menos traz algum critério... Que obviamente, não deveria, tal como todas as guidelines, prevalecer sobre o senso e a avaliação clínicos...

Catsone disse...

Caro psiquiatra, tem toda a razão no seu comentário.
Eu exemplifiquei apenas uma situação que pode incluir toda aquela sintomatologia. ;)

Anónimo disse...

Porquê por em causa a triagem de Manchester, quando nesta e noutras situações relatadas pela comunicação social, a triagem está correcta. Não são é cumpridos os tempos de atendimento médico subsequente.
Agravado nesta situação pelo facto de ter sido observada por médico, 3 vezes.
A triagem tem características científicas que a tornam altamente fiável, objectiva e eficaz. Assim pudesse ser efectuado o atendimento posterior...

Anónimo disse...

Isto tem de se dizer, quando não andamos às voltas e não chegamos a lado nenhum e mais não fazemos que tapar o sol com uma peneira.
A triagem de Manchester é boa e necessária quando se faz triagem pela PRIMEIRA VEZ, a um utente que vai a um serviço da rede de urgência/emergência, quando o doente é transferido, já existe um diagnóstico de presunção e esse doente é encaminhado para uma especialidade médica, devendo ser imediatamente atendido por essa especialidade, daí a INUTILIDADE da TRIAGEM DE MANCHESTER nesta fase! Portanto NUNCA SE DEVE FAZER A TRIAGEM DE MANCHESTER, MAS NUNCA em doentes transferidos!
Só aqui, neste país é que isto acontece.
Não passa de uma ESTUPIDEZ, que pode provocar este e outros acidentes.

Anónimo disse...

Completamente de acordo com o post anterior. Os que defendem triar o que já foi triado por alguém de conhecimento médico, que defenda a sua posição. Atenção, eu não sou médico, apenas utente que quer saber porque defendem um sistema absurdo.

Anónimo disse...

Então mas a triagem foi bem feita... O doente tinha a cor amarela logo deveria ser vista em pouco minutos por um médico que aí deveria diagnosticar o que não foi diagnosticado. Agora a MANCHESTER também faz diagnósticos não? Não tapem o sol com a peneira!

Anónimo disse...

Crises de ansiedade com dispneia, arritmia, lipotimias e sincopes são o pão nosso de cada dia num SU hospitalar... deus nos livre se fossem todos de causa cardiaca!! duvido que esta doente tenha sempre tido alta sem nunca ter feito investigação etiologica... então alguém vai 3 vezes ao SU e os enfermeiros e os medicos enganam-se sempre nas 3 vezes? Não é coincidencia a mais, eram todos ignorantes ou maus profissionais? Estavam todos a dormir nas 3 vezes ou estavam-se a borrifar para a doente nas 3 vezes?

Claro que o caso teria de ser muito atipico e são exactamente estes os casos que têm um mau desfecho.