sábado, outubro 04, 2003

Vitriólica - A Doméstica-Cibernética

Todos os dias, digo, penso, exijo, para os meus botões: hoje tem que continuar a ser um período de reflexão. Não posso ir, nem ao meu, nem a qualquer outro blog.
Mal ligo o computador, desta vez foi o portátil, longe do local habitual, já lá estou, antes de pensar que não quero ir. Será dependência? Será que estou adicto? É uma boa adicção, mas preocupa-me.

E assim descobri um blog caloiro, mas muito interessante pelos 4 dias de vida e pelas 5 mensagens lá afixadas.

Enviei-lhe esta mensagem:

"Se todas as domésticas (nome que abomino)/donas de casa (já posso aceitar) fossem como a Vitriólica, metade das depressões e distimias que se observam nas mulheres que trabalham para a família desapareciam.
Gostei da sua ideia e só desconfio se será só "doméstica"
Parabéns.
"

E é uma crua e real verdade. As mulheres domésticas ou donas de casa merecem da minha parte e sempre que as consulto uma atenção redobrada pois poderá existir uma depressão ou distimia disfarçada por outras queixas.
Todos sabemos que vivemos numa sociedade patriarcal, marialva, dominada pelo homem, pelo marido, pelo pai e até pelo avô.
Por mais excepções que existam, por mais avanços que se tenham conseguido, por mais woman's libs que se organizem, por mais legislação paritária que se promulgue, o estigma da mulher doméstica lá está.
A sua vida tem horizontes muito limitados, os seus canais de comunicação são a nossa televisão que só lhes proporciona incultura, misticismo, sentimentos balofos, concursos infantis, piadas brejeiras e fáceis, o que lhes aumenta a iliteracia, o analfabetismo cultural, etc.
Por outro lado, o seu trabalho não é reconhecido, não têm salário e vivem daquilo que o marido lhes dá, com o consequente controle de que é sempre mal gasto. Não pode chegar tarde ao emprego, não tem colegas para conversar (só as vizinhas, que sofrem da mesma síndroma que elas).
Passam as 8 horas do dia sozinhas, e quando o marido e o resto da família regressam a casa, (que bom é regressar a casa cansado e poder descansar) lá está ela novamente a servir a família com as suas necessidades e exigências.

Acreditem que muitas vezes proponho para as minhas doentes com estas características, com quelxas politópicas, contínuas, subjectivas, uma actividade profissional, produtiva, que muito tem ajudado. O difícil por vezes é a descoberta de um emprego.

Por isso tenho uma admiração especial pelas domésticas do nosso país, aquelas que o são há dezenas de anos e consumidoras habituais de antidepressivos e ansiolíticos.

Se todas fossem como a Vitriólica (Vi para os amigos, como diz) teríamos a nova doméstica-cibernética, que se libertaria da limitação dos horizontes que a "profissão" lhes impõe.

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