sexta-feira, dezembro 19, 2003

Boa Opinião

Alfredo Vieira
Data Quinta-Feira, 18 de Dezembro de 2003, 11:14
Para medicoexplicamedicina@iol.pt
Assunto: genéricos...
Exmo colega...

A tal polémica de que falou, sobre a prescrição deste ou daquele mesmo princípio activo de marcas diferentes, só existe por um motivo: não temos qualquer razão. Nenhuma razão. Acreditamos na ciência e sabemos bem que não conseguimos distinguir entre duas moléculas diferentes. O empirismo com que nos defendemos é insustentável, e incrivelmente corrosivo para a nossa credibilidade. A distinção requer estudos cuja complexidade os desenquadra das nossas possibilidades. A distinção cabe ao Infarmed. Nós só podemos fazer uma coisa: acreditar no mesmo princípio activo, e julgá-lo por igual a outro descrito como sendo igual.
Há corrupção na classe, e o colega sabe-o. Desde a pequena e inofensiva "simpatia" do congresso da treta em local distante para turismo, até à oferta, diz-se, de dinheiro e bens, casos obviamente de polícia. Depende sempre da consciência do médico, e essa consciência não se despe, nem é comprovável em televisão, nos jornais e em tribunal.... Claro que também há os patrocínios de congressos com valor inequívoco; para apresentações de casos clínicos, de estudos, etc.... Mas o que há sobretudo é a apresentação do fármaco x pelo laboratório y, e que não interessa, cuja informação real se encontra em 2 linhas de muitos sítios da internet e das revistas a que temos acesso... Essa situação, já o compreendeu, desgosta-me muito. Somos uma classe intelectualmente ímpar, honrada, e que se torna vítima de ataques vis, por um assunto ridículo como este, e pela atitude vergonhosa de alguns de nós. Que, hoje em dia, e graças aos meios de comunicação que desgraçadamente temos, mina a credibilidade de todos.
Sugestão: acabe-se pois com a diversidade de marcas de um mesmo princípio activo. De uma vez por todas. Que alguém, no ministério, se responsabilize por um concurso entre todas as marcas de cada princípio activo, e só permita a comercialização de um único. Que se tire do médico o ónus da escolha, e a suspeição do favorecimento ilícito. E agora, e em maiores proporções concerteza, do farmacêutico.... E que desse modo o estado assuma, também, a responsabilidade do produto que comercializa.
Quanto ao efeito placebo, todos sabemos que a água disfarçada de fármaco "cura" uma boa parte dos nossos doentes. 20-30%, dizem alguns estudos.... Esse efeito depende, porém, da acção do médico, que o confere ou não a um placebo, conforme a vontade e a arte lho permite. Por isso, o efeito placebo de um medicamento de marca obviamente que deixa de existir se um médico prescreve o genérico pouco convictamente. Mas isso seria uma longa conversa, o essencial resume-se ao facto de pouco importar a realidade do fármaco no efeito-placebo, mas antes o médico, e a sua relação com o paciente.

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Alfredo L S Vieira


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